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redes nos rios

redes nos rios

Olhei essa foto perdida no meu notebook e pensei em contar sobre esse lugar: em dezembro de 2009 fomos eu e minha namorada visitar um parente querido na não menos querida cidade de Maués, no Amazonas. Uma das coisas que temos em comum, além do gosto por bons vinhos e pelo apreço a boas companhias (inclusive a nossa própria ;D), é o fato de termos fortes laços com o interior do Amazonas. Minha querida mãe já escreveu dois livros com enfoques psico-sociais acerca das belezas do tal “beiradão” amazônico, mas com certeza foi meu pai quem me deu a certeza de que nunca poderia fugir a minha origem cabocla. Ela nasceu por lá, isso por si só já diz muita coisa.

Foi num barco, especificamente numa rede, que eu recebi a notícia de que não tinha passado entre os 40 de engenharia da computação. Mas que tinha nota o suficiente pra escolher qualquer outro curso do Instituto de Tecnologia da Amazônia. Perguntei ao meu pai, frente às opções dadas (engenharias mil: mecânica, de produção, elétrica, civil e florestal) qual ele escolheria. Ele me disse que o curso que tinha vontade de fazer era florestal, dada a ligação que ele achava que a área de conhecimento tinha com a sua origem amazônica. E essa decisão refletiu pro resto de minha vida, uma vez que nunca achei uma floresta – ao contrário de uma rede, ao vento – um lugar que pode-se chamar de aprazível.

Mas 10 anos após esta decisão, eu mal podia lembrar como era estar numa rede, navegando por um imenso rio. Não fazia tanto tempo assim (os 10 anos) que tinha estado em situação parecida, mas olhar pra águas barrentas e sentir o vento mentiroso, aquele que faz parecer que você está no clima mais perfeito do mundo quando na verdade é exatamente o contrário, no rosto me trouxe sensações singulares.

Tudo bem que a experiência de 600 pessoas apinhadas em um mesmo lugar, lugar este minúsculo perante a imensidão do rio que te cerca, não é lá das mais românticas; a viagem dura cerca de 18 horas e eu juro que não dormi meio segundo sequer. Mas lembrei de quando íamos conhecer municípios que a maioria dos brasileiros só conhece quando acontece alguma desgraça que passa no jornal nacional. Era época de descobertas e travar contato com a simplicidade do interior amazônico é experiência, na falta de adjetivos, singular. Engraçado quando se é adolescente imaginar que se está indo em lugares tão distantes e inóspitos. Fato que mesmo os amazonenses, em geral, pouco conhecem sobre os gigantes municípios do seu estado: Pra ilustrar,Maués possui cerca de 26 vezes a área do município de São Paulo e ocuparia 99% dos países baixos, em quantitativo de área.

Isso pra dizer que a mesma sensação que eu tenho de ser um pontinho insignificante quando ando pela Av. Paulista eu tenho quando me vejo no meio do rio Amazonas. De uma maneira diferente, é verdade, mas a mesma sensação de impotência me afeta. Pra melhorar o céu da região exibe tantas zilhões de estrelas que ao contempla-lo a sensação de nada, de vazio, de absurda insignificância torna-se mero detalhe. Extasiados, os mortais podem apenas meditar sobre suas vidas e tentar traçar novos caminhos de existência. Ou talvez se importunar por ter que cheirar o pé alheio, ter que aguentar pessoas diminutas correndo ou jogando plásticos de bombons rio abaixo, ou mesmo ter de ouvir até as 23:59 um forró-brega-sertanejo-pagode da melhor qualidade em volumes que beiram a insanidade. Mas isso são apenas pessoas…

Fato é que quando a gente estuda sobre redes (quaisquer delas) como as redes sociais e quando vê as imagens de satélite dos rios da amazônia, é impossível não pensar nas inúmeras relações entre forma e conteúdo. E o mais divertido: impossível não pensar que o transporte fluvial na Amazônia poderia ser além de poético, estudo de caso para as mais diversas ciências. Mas se eu pudesse escolher uma, seria a filosofia, ou meramente o poder de pensar na vida olhando pra correnteza do rio.

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